“Alceu, eu te amo!”

Alceu era a definição perfeita de volante chucro. Caneludo, praticante do sarrafo livre e ruim de dar dó – dos torcedores que aguentaram ele em campo por longos anos. Até que ele surgiu bem em 2003, marcando gols com alguns chutes de longa distância, mas foi só subirmos para a série A para percebermos a categoria – ou falta dela – inerente a esse sujeito. De fato, a presença dele no time nos irritou até o final de 2006, sendo que no meio tempo ele teve até mesmo a pachorra de vestir a camisa 10(!), envergada por diversos craques da história do Palmeiras e estranhamente vestida por ele.

Os frequentadores dos bares de esquina da Rua Turiassu com a Rua Caraíbas (Alviverde e Bar do Sílvio) também devem se lembrar de um senhor que esporadicamente entoava um grito um tanto quanto incomum, mas engraçado:

- ALCEU, EU TE AMO!

Sim, era um grito curioso, pois Alceu era o símbolo da mediocridade daquele time que foi para a pausa da Copa de 2006 na vice-lanterna do Brasileiro. Ao mesmo tempo era engraçado, pois nunca imaginaríamos uma ironia tão legal com voz grave e em altos decibéis. Essa cena se repetiu por vários jogos a fio, até mesmo quando o Alceu desfilava sua "classe" em outras pelejas nos anos subsequentes.

Um dos jogos que ouvi isso foi em uma tarde chuvosa de sábado, final de julho de 2006. O Palmeiras continuava com um time tenebroso que possuia raros bons valores, mas tinha conseguido engatar uma boa sequência de vitórias antes desse dia – 4 x 2 no Vasco, 1 x 0 no dérbi e um ótimo 3 x 1 contra o Goiás em pleno Serra Dourada. Esse jogo seria o segundo no Palestra pós-copa e a confiança após essas vitórias propulsionou um Palestra lotado mesmo com a chuva fria que caiu naquele fim de sábado. O jogo também era pertencente à promoção Nestlé, mas àquela altura, a bagunça já havia sido instaurada no que se refere a adquirir ingressos por esse método.

A tarde também tinha sido particularmente especial para mim, afinal, esse dia também foi um dos primeiros de muitos jogos que vi com amigos que então ainda estava conhecendo. Como bônus final, ainda tive o privilégio de visitar a sala de troféus do Palmeiras pela primeira (e até então única) vez em minha vida, cortesia do finado Ronaldo (que Deus o tenha).

Dentro de campo, iriamos enfrentar o Paraná Clube de Caio Jr., Pierre, Edmilson Canhão do Pantanal, Gustavo e cia, jogadores (e estagiário) que aterrissaram no Palmeiras no ano seguinte. Eles realizavam uma boa campanha e aquele jogo era uma espécie de batismo de fogo para consolidar a reação na tabela e poder almejar alguma coisa no campeonato.

Além do já citado Alceu, nesse dia o Palmeiras contava com outros bondes aterradores como Michael, Francis, Roger Bernardo, Roger centroavante (ou algo do gênero) e Enilton. Os bons valores de linha eram parcos e já acima dos 30, como Edmundo, Juninho Paulista e Paulo Baier. No gol, Diego Cavallieri se consagrava.

Em campo, o time correspondia bem as expectativas pré-jogo e conseguiu abrir 2 x 0, tranquilizando a arquibancada. Eu particularmente estava feliz, era a segunda vez que estava vendo o jogo com pessoas novas – geralmente era eu e meu pai apenas – e compartilhava a alegria de comemorar as primeiras vitórias com pessoas que até hoje são meus amigos e companheiros de arquibancada.

Durante as eventuais cornetadas que proferíamos durante a peleja, elogiávamos o desempenho de alguns bagres naquela partida, incluindo o Alceu, que fazia uma partida surpreendentemente acima da média – o que vindo dele, não era lá grandes coisas. Comentávamos também que o tio que gritou “Alceu, eu te amo” devia estar em polvorosa com a partida boa que o rapaz fazia.

Porém, em questão de minutos a alegria geral perdeu espaço para a consternação. Em pouco tempo, o Paraná conseguiu empatar a partida e perigava até mesmo virar o jogo.

Apesar do clima de preocupação, o atacante Roger fez um dos dois gols pela pavorosa passagem dele pelo Palestra e nos colocava novamente na dianteira do placar. Um arroubo de alívio veio para a alma dos palestrinos presentes naquele momento.

Mas como a nossa sorte daquele ano era escassa, não dava para contar com placar com contagem mínima. Esse tipo de situação dá chances para o acaso derrubar a alegria de todos os torcedores presentes.

Foi ai que apareceu uma falta de longa distância, na intermediária. Alceu se posicionou e parecia que iria isolar a bola e garantir a leitoa da noite e em um tom de brincadeira soltei:

- To sentindo que essa bola vai entrar.

Antes da própria cobrança acontecer, essa frase se tornou motivo de galhofa por alguns anos a fio e alguns até hoje me perguntam se “estou sentindo a bola entrar” quando temos jogadas de bola parada.

A verdade é que ninguém acreditou que aquela cobrança do Alceu iria acertar a meta. Um verdadeiro golaço. Garantiu a tranquilidade da noite, os 3 pontos e a alegria que se fez presente naquela rara tarde feliz de um sábado pelos lados alviverdes. Os que me zoaram pela minha frase me abraçaram na sequência – mas nunca perdoaram o deslize.

O fim da noite foi feliz para todos, especialmente para o tio que tanto gritou “Alceu, eu te amo”. Naquela noite, o estádio inteiro gritaria isso.

1 comentários:

E QUE GOL foi aquele, QUE GOL

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